ALÔ, BEER INFLUENCERS: ASPECTOS JURÍDICOS DA CONTRATAÇÃO DE INFLUENCIADORES DIGITAIS

Posted by Advogado Cervejeiro In: Cobrança, Consumidor, Publicidade, Sommelier No comments

Não é novidade que as marcas já perceberam a importância dos influenciadores digitais para a divulgação de seus produtos e/ou serviços, sendo que tal prática já alcançou fatia considerável do mercado publicitário.

No entanto, como o influencer é um segmento ainda recente, cuja atividade não está ancorada em nenhuma legislação específica, as contratações são realizadas na informalidade, o que é bastante temerário.

Este caso recente repercutiu fortemente na comunidade cervejeira: uma publicação realizada por uma influenciadora digital em sua página do Instagram divulgou uma chopeira portátil que, segundo consta no texto publicado, “ativa o fermento da cerveja, refinando o sabor e a textura”, informação que é falsa e induz o consumidor ao erro.

Tal situação ilustra apenas um dos vários riscos envolvendo a contratação de influenciadores digitais para divulgação de produtos ou serviços sem uma análise jurídica prévia adequada de seu conteúdo.

IDENTIFICAÇÃO PUBLICITÁRIA

O primeiro aspecto que merece destaque no assunto diz respeito à própria identificação do conteúdo como sendo de cunho publicitário, deixando claro ao público que aquela publicação advém de um acordo comercial com o anunciante e não representa, necessariamente, a opinião pessoal do influenciador.

De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal (art. 36).

O objetivo dessa proteção legal ganha ainda mais relevo atualmente, em que as opiniões, os costumes e as atividades de pessoas influentes no meio digital possuem forte apelo popular, gerando grande repercussão.

Além do CDC, nós já alertamos em outros textos a respeito da importância de as cervejarias seguirem as orientações do CONAR (órgão que autorregulamenta o mercado publicitário) no tocante à publicidade envolvendo bebidas alcoólicas.

Em seu Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, o CONAR também disciplina a fundamental importância do princípio da identificação, afirmando que o anúncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua forma ou meio de veiculação (art. 28).

Portanto, a identificação publicitária, por ser um dever a ser observado em qualquer ação publicitária, também recai sobre o uso de influenciadores digitais, mercado que nitidamente descumpre frequentemente tal obrigação.

PUBLICIDADE ENGANOSA

Outra regra fundamental a ser observada em qualquer conteúdo publicitário é a proibição da utilização de publicidade enganosa, conceituada pelo CDC como sendo aquela que, inteira ou parcialmente falsa, mesmo por omissão, é capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços (art. 37, § 1º).

De igual forma, o CONAR abre o seu Código explicitando, logo no artigo 1º, como princípio geral, que todo anúncio deve ser respeitador e conformar-se às leis do país; deve, ainda, ser honesto e verdadeiro.

A mencionada publicação da “chopeira portátil” traz informações falsas que induzem os consumidores a pensar ser possível transformar cerveja em chope a partir da “ativação” da levedura, o que refinaria o sabor e a textura da bebida, em nítida afronta ao artigo 37 do CDC.

Da forma como redigido, o anúncio abusa da confiança do consumidor ao explorar sua falta de conhecimento técnico e sua capacidade de acreditar nos conteúdos divulgados por aquela influenciadora digital (art. 23 do Código do CONAR).

Tão grave é que o CDC qualifica a publicidade enganosa e/ou falsa como crime contra as relações de consumo. A conduta da influenciadora digital e do anunciante que patrocinou a publicação poderia, em tese, configurar os tipos penais descritos nos artigos 66 e 67 do CDC:

Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:

Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.

§1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.

§ 2º Se o crime é culposo;

Pena: Detenção de um a seis meses ou multa.

Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva:

Pena: Detenção de três meses a um ano e multa.

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

Além da observância dos dois pilares publicitários que vimos acima, é fundamental que o anunciante esteja protegido contratualmente perante o influencer ao celebrarem alguma relação jurídica.

Existem diversos aspectos envolvidos na produção e na publicação de anúncios publicitários que merecem atenção jurídica, especialmente no tocante aos direitos autorais sobre o conteúdo (Lei nº 9.610/98), aos direitos de personalidade do influenciador (art. 20 do Código Civil e art. 5º, inc. X, da CF), às métricas de resultado, à confidencialidade, à exclusividade e à não concorrência do influencer com outras marcas do mesmo segmento.

É essencial prever em contrato, de forma clara e expressa, qual uso do conteúdo eventualmente criado pelo influenciador será permitido ao anunciante, por exemplo: quanto tempo poderá veicular, em que mídias, de que formas e em quais formatos, se poderá ter edição pelo anunciante etc.

Em linhas gerais, o contrato deve responder às perguntas mais básicas da relação, recomendando-se a adoção das seguintes cláusulas, entre outras que se fizerem necessárias:

Cronograma de atividades: prazos de postagem, tempo em que o conteúdo ficará disponível etc.;

Penalidades e multas: coibir o atraso ou não cumprimento do cronograma;

Briefing: anuência e orientação prévia do anunciante em relação ao conteúdo a ser produzido pelo influenciador;

Reexecução com novos prazos de entrega, caso o anunciante julgue inadequado o conteúdo desenvolvido pelo influenciador;

Transparência: obrigação de o influenciador identificar a campanha como publicitária ao público;

– Definição da titularidade do conteúdo produzido para a campanha;

Remuneração ao influenciador digital pela prestação dos serviços e concessão dos conteúdos;

Exclusividade: por quanto tempo e em que termos o influenciador não poderá representar concorrentes do anunciante;

Contratação personalíssima: apenas aquele influenciador pode executar as tarefas contratadas;

Autorização do uso da marca, concedida pelo anunciante ao influenciador digital em caráter temporário.

A conclusão é a de que, considerando que o mercado de anúncios publicitários via marketing de influência ainda seja muito informal, a ausência de um contrato definindo claramente as obrigações e responsabilidades das partes gera muita insegurança jurídica.

Se surgir um problema mais grave, seja diretamente nas obrigações entre as partes, seja decorrente da inadequação do conteúdo publicado, fica muito mais difícil para as partes comprovarem seus direitos e obrigações e o eventual descumprimento contratual caso elas não tenham formalizado sua relação em um contrato especialmente redigido para esses fins.

 

Vinícius Verdi Borges, sócio do escritório Lopes, Verdi & Távora Advogados.

 

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