Para que todas as informações importantes estejam ao alcance dos apreciadores e consumidores de cerveja, os rótulos devem seguir algumas regras previstas na legislação brasileira.
A rotulagem de bebidas é regulamentada principalmente no Decreto nº 6.871/2009, mas também há regras específicas estabelecidas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO), pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
CONTEÚDO DO RÓTULO
Em primeiro lugar, é importante saber o conceito de rótulo, que vem insculpido no art. 10 do Decreto:
Art. 10. Rótulo é toda inscrição, legenda, imagem ou matéria descritiva, gráfica, escrita, impressa, estampada, afixada, afixada por encaixe, gravada ou colada, vinculada à embalagem, de forma unitária ou desmembrada, sobre:
I – a embalagem da bebida;
II – a parte plana da cápsula;
III – outro material empregado na vedação do recipiente; ou
IV – em todas as formas dispostas nos incisos I, II e III.
Na sequência, o art. 11 determina que cada unidade de cerveja deverá conter, em seu rótulo, algumas informações visíveis e legíveis, sendo que o INMETRO e o MAPA também têm atos normativos regulando os caracteres. Abaixo, as principais informações obrigatórias:
1) nome empresarial e endereço do produtor ou fabricante, do padronizador, do envasilhador ou engarrafador ou do importador;
2) número do registro do produto no MAPA;
3) denominação do produto em item distinto e destacado das demais informações do rótulo, com letras impressas em negrito, em cor única e em contraste com o fundo do rótulo. Os caracteres devem, ainda, respeitar tamanhos mínimos a depender da quantidade de líquido;
4) marca comercial;
5) lista de ingredientes em ordem decrescente de proporção. Logo após ou abaixo da lista de ingredientes deve vir advertência sobre a presença direta ou de derivados de ingredientes alergênicos (incluindo o glúten);
6) a expressão “Indústria Brasileira”, por extenso ou abreviada;
7) conteúdo líquido expresso em unidade de medida de volume, em cor contrastante com o fundo onde estiver impresso ou com o líquido, caso a embalagem seja transparente. O símbolo da unidade de medida depende da quantidade de líquido (“ml” para menos de 1 litro; “l” a partir de 1 litro). O INMETRO também disciplina que o tamanho dos algarismos que indicam a quantidade de líquido depende do conteúdo líquido.
8) graduação alcoólica, expressa em porcentagem de volume de álcool etílico, à temperatura de vinte graus Celsius;
9) identificação do lote ou da partida;
10) prazo de validade;
11) frase de advertência “Evite o Consumo Excessivo de Álcool”.
CLASSIFICAÇÃO E TIPO DE CERVEJA
A classificação da cerveja também é importante para fins de rotulagem. Nesse ponto, uma importante modificação normativa adveio com a publicação do Decreto nº 9.902, em julho de 2019, que acabou por revogar uma série de dispositivos do Decreto nº 6.871/2009.
A partir de tal ato normativo, as cervejas são conceituadas assim no ordenamento brasileiro:
Art. 36. Cerveja é a bebida resultante da fermentação, a partir da levedura cervejeira, do mosto de cevada malteada ou de extrato de malte, submetido previamente a um processo de cocção adicionado de lúpulo ou extrato de lúpulo, hipótese em que uma parte da cevada malteada ou do extrato de malte poderá ser substituída parcialmente por adjunto cervejeiro.
- 1º A cerveja poderá ser adicionada de ingrediente de origem vegetal, de ingrediente de origem animal, de coadjuvante de tecnologia e de aditivo a serem regulamentados em atos específicos.
- 2º Os adjuntos cervejeiros previstos no caput e qualquer outro ingrediente adicionado à cerveja integrarão a lista de ingredientes constante do rótulo do produto, na forma especificada em ato do Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
A mudança é significativa, pois, ao revogar uma série de dispositivos do Decreto nº 6.871, a cerveja tem seu conceito bem mais ampliado, porque passa a aceitar mais ingredientes na sua receita, especialmente matérias-primas de origem animal ou vegetal, deixando de ser qualificada como “bebida alcoólica mista”.
No entanto, mesmo que tenham sido revogados tais dispositivos do Decreto nº 6.871/2009, está mantida a obrigatoriedade de apresentar a classificação da cerveja no rótulo, pois a Instrução Normativa 65 de 2019 do MAPA (publicada em dezembro de 2019, revogando as anteriores IN 54/2001 e IN 68/2018), que estabelece os padrões de identidade e qualidade para os produtos de cervejaria, está em pleno vigor.
Entre alguns pontos inovadores da IN 65/2019, é possível citar:
– criação da classificação “cerveja com teor alcoólico reduzido” ou “cerveja com baixo teor alcoólico”, aquelas cujo teor alcoólico seja entre 0,5% e 2%;
– definição de “cerveja gruit”, que possibilita a substituição total do lúpulo por ervas;
– simplificação das classificações da cerveja (“cerveja”, “cerveja puro malte”, “cerveja de …”, “cerveja puro malte de …”); e
– permissão da inclusão de matérias-primas de origem animal (ex. leite, mel) e outros ingredientes de origem vegetal (ex. cogumelos) na cerveja.
Do ponto de vista normativo, o que mudou agora, portanto, é que está mais simplificado e desburocratizado o procedimento de atualização do Padrão de Identidade e Qualidade da cerveja (PIQ). A partir do Decreto nº 9.902, o MAPA poderá publicar a atualização por meio de instruções normativas, sem a necessidade de alterar o texto do Decreto nº 6.871.
NOVA REGRA SOBRE OS INGREDIENTES
Outra recente e importantíssima mudança foi editada pelo MAPA em novembro de 2018, visando a adequar os rótulos das cervejas ao direito dos consumidores em receber informações claras e precisas sobre os ingredientes primordiais das bebidas.
Trata-se da Instrução Normativa (IN) nº 68, proveniente de um Termo de Acordo homologado judicialmente nos autos da Ação Civil Pública nº 23733-44.2016.4.01.3500, processo movido na Justiça Federal de Goiás pelo Ministério Público Federal contra os grandes conglomerados cervejeiros (Ambev, Kirin, Petrópolis e Kaiser).
A IN nº 68 estabelece a obrigatoriedade de constar, de modo claro, preciso e ostensivo, nos rótulos das cervejas, as informações que indiquem quais os ingredientes que compõem o produto.
A partir de novembro de 2019 (haja vista que a IN concede o prazo de 365 dias para adequação das cervejarias), o adjunto ou conteúdo cervejeiro terá que especificar os nomes dos cereais e matérias-primas no rótulo do produto final, em substituição às expressões genéricas de cereais não malteados ou maltados.
O produto cervejeiro, proveniente de cereal ou amido, deverá ser relacionado na lista de ingredientes, em ordem decrescente, na relativa proporção, e apresentará a denominação do vegetal que lhe deu origem: arroz, trigo, milho, aveia, triticale, centeio, sorgo e outros.
Por exemplo, “gritz de milho” ou “xarope de milho” terão de ser denominados no rótulo simplesmente como “milho”; ou “quirera de arroz” será somente “arroz”.
Também os açúcares deverão ter a denominação acrescida do nome da espécie vegetal de origem, por exemplo, “açúcar de cana”.
PROIBIÇÕES
Além de dever conter várias informações obrigatórias, cujos caracteres têm de seguir determinados tamanhos e formatos, os rótulos também possuem algumas vedações.
O rótulo da cerveja não pode conter qualquer informação que suscite dúvida ou que seja falsa, incorreta, insuficiente ou que venha a induzir a equívoco, erro, confusão ou engano, em relação à identidade, composição, classificação, padronização, natureza, origem, tipo, qualidade, rendimento ou forma de consumo da bebida, nem lhe atribuir qualidade terapêutica ou medicamentosa.
É igualmente proibido salientar qualidades intrínsecas da cerveja, induzindo o consumidor a erro. Por exemplo, não é possível afirmar no rótulo “esta cerveja não contém colesterol”, pois nenhuma cerveja contém colesterol.
REGISTRO, FISCALIZAÇÃO E SANÇÕES
Cabe ao MAPA a inspeção e a fiscalização sobre todos os aspectos referentes às bebidas produzidas no País, o que inclui, claro, os rótulos.
Também o INMETRO realiza, eventualmente, algumas inspeções técnicas, no sentido de verificar se os caracteres impressos nos rótulos estão adequados em tamanho e formato.
É muito importante a observância das regras, pois constitui infração a utilização de rótulo em desconformidade com as normas legais vigentes, podendo gerar sanções que vão desde a advertência e a aplicação de multas até a cassação do registro da cervejaria e a proibição da venda de suas cervejas.
Vinícius Verdi, sócio do escritório Lopes, Verdi & Távora Advogados.
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